Pêssankas: a arte milenar ucraniana que inspira os ovos de Páscoa
Quando pensamos em ovos de Páscoa, a primeira imagem que vem à cabeça costuma ser a de chocolates coloridos. Mas muito antes dessa tradição doce ganhar o mundo, uma arte milenar já celebrava o simbolismo do ovo como sinal de vida, renovação e esperança. Estamos falando das pêssankas, os belíssimos ovos decorados à mão que fazem parte da cultura ucraniana e ganham destaque especialmente durante a Páscoa.
O que são as pêssankas?
O nome vem do verbo ucraniano pysaty, que significa “escrever”. E é exatamente isso que se faz nas pêssankas: escreve-se com cera e tintas sobre ovos, desenhando símbolos que carregam significados profundos. A prática é antiga, com registros anteriores ao cristianismo, ligada a rituais pagãos de fertilidade e celebração da primavera. Com a chegada do cristianismo à região, os significados foram incorporados à Páscoa, e os ovos passaram a representar também a ressurreição de Cristo e a vitória da vida sobre a morte.
Como são feitas

A produção de uma pêssanka exige paciência e técnica. Existem algumas técnicas diferentes para fazê-las. A mais famosa usa um instrumento chamado kistka, que lembra uma caneta, para aplicar cera de abelha derretida sobre a casca do ovo, preservando as partes que não receberão tinta. Em seguida, o ovo é mergulhado em sucessivos banhos de cor, sempre do tom mais claro para o mais escuro. Após cada mergulho, novos traços são feitos com cera para proteger áreas específicas. No fim do processo, a cera é retirada com calor, revelando o desenho completo.
As cores e os símbolos não são aleatórios. O vermelho, por exemplo, representa o amor e a vida. O preto, a eternidade. Já os desenhos — como flores, estrelas, cruzes e animais — também têm significados diversos, ligados à proteção, fertilidade, saúde e prosperidade.
A tradição das pêssankas no Brasil

Com a chegada dos imigrantes ucranianos ao Brasil, especialmente ao Paraná, a tradição das pêssankas encontrou um novo lar. Em Curitiba, a arte foi mantida viva por gerações — e um dos grandes responsáveis por essa preservação é o artista Jorge Serathiuk, segundo reportagem do Bem Paraná. Nascido em uma família ucraniana, ele começou a fazer pêssankas ainda criança, influenciado pelas mulheres da comunidade. Hoje, Serathiuk é reconhecido como um dos maiores divulgadores da cultura ucraniana no Brasil e utiliza as pêssankas como ferramenta de memória e identidade. Para ele, cada ovo decorado carrega a história de um povo e deve ser valorizado como patrimônio imaterial.
Maurício Linécia, nascido em Iracema (SC), trouxe uma abordagem inovadora para a arte das pêssankas ao incorporar novos materiais e técnicas. Ele trabalha com ovos de madeira torneados e também com cascas de ovos de avestruz esvaziadas, aplicando tinta acrílica e uma camada fina de verniz. Embora utilize a sobreposição de cores como na tradição, sua técnica se diferencia por não seguir o processo tradicional de ocultar e revelar imagens ao final. Em vez disso, suas composições vão surgindo aos poucos, com cada pincelada revelando novas formas em um processo completamente visível, marcado pela precisão e pela delicadeza.
Mais do que decoração: uma mensagem
Presentear alguém com uma pêssanka é desejar coisas boas. Cada símbolo e cor escolhidos no ovo carrega uma intenção — um gesto de cuidado, proteção e carinho. E é por isso que, mesmo em tempos modernos, com chocolates e coelhinhos por toda parte, essa arte ancestral segue encantando gerações e inspirando uma Páscoa com mais significado.
No fim das contas, as pêssankas nos lembram que, mais do que presentes ou doces, o que vale mesmo é a mensagem que entregamos ao outro — de esperança, de vida nova e de beleza nas pequenas coisas.